segunda-feira, 22 de julho de 2013

Caetano abraça Garanhuns

Show da turnê Abraçaço arrebata público do sábado

Publicado em 21/07/2013, às 19h43

Bruno Albertim

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Se Recanto é, como ele mesmo diz, um disco de Caetano cantado por Gal, Abraçaço é também transCaetano. Para ressaltar o jeito híbrido, malandro, polissêmico, heredoxo de apresentar suas peças, Caetano lançou mão de um conceito: disse que não é rock o que faz agora, com o final da trilogia com o excelente power trio da banda Cê. Mas transrock. Ao incorporar sambas, afoxés e outros badauês às guitarradas, é, portanto, transCaetano.
Caetano cantando Caetano deixou em êxtase coletivo a multidão da Praça Guadalajra no último sábado. Palco nu, apenas os rapazes da banda em seus postos, um dos pés suspensos, ele dá início com a seminal A bossa nova é foda, arrancando o primeiro coro da plateia. Tensiona o público, mas logo vai da aspereza apaixonada da primeira música para a delicadeza lírica de Coisa linda.
O novo disco é executado quase que integralmente. Mas em alguns momentos, clássicos de outros Caetanos ganham leitura mais hard com a guitarra de Pedrinho Sá e a bateria de Marcelo Callado.Triste Bahia, ganha densidade roqueira, noisy, quase psicodélica, como se não tivesse pertencido à Transa, mas ao radical álbum Araçá Azul. Recônvexo ganha afagos ásperos da guitarra de Pedro Sá.
Já no final, o amigo Arto Lindsay que estava nos bastidores depois de ter tocado com a Orquestra Contemporânea de Olinda subiu ao palco e, com as antinotas de sua guitarrasa, desconstruiu a radiofônica Você não entende nada. Em Eclipse oculto, simulou tirar a blusa e não ecomomizou nos gestos sexualizados - aliás, o recurso à sexualização da performance, de Ney à Karina Buhr, tem marcado presença na Guadalajara.

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Recônvexo ganha afagos da guitarra. Na canção-título, "Abraçaço", se ouve: "Meu destino eu não traço / Não desenho ou desfaço / O acaso é o grão-senhor / Tudo o que não deu certo / Eu sei que não tem conserto / Meu silêncio chorou chorou". E Caetano encarava a plateia, provocativo, como se disesse: eu sou trans. Sou Caetano. Deixando a fina estampa, o terno, o banquinho e o violão de lado, o que Garanhuns viu no último sábado foi Caetano interpretando um outro Caetano. Mesmo que para lembrar que a bossa nova é foda.
Antes dele, os meninos da Orquestra Contemporânea de Olinda pareciam ter tomado azougue, tamanha a carga incediária com que deram início ao conserto quase sempre sublinando pelo frevo com pose de rock star. Nas coxias, a banda de Caetano acompanhava atenta ao que se dava no palco. "O trabalho deles é muito forte, complexo, denso", dizia Pedro Sá.
Mas quando o produtor do último disco da banda, Arto Lindsay entrou, descontruiu vigorosamente a orquestra. Botou sua guitarra para dialogar com cada um dos instrumentos. O duelo com a bateria de Gilsinho parecia quase sexual. "Mas são esses meninos que estão me ensinando mais sobre o sexo", dizia ele, bem-humorado, nos bastidores, feliz por estar de volta à cidade onde, antes de produzir gente com Gal e Marisa Monte, morou quarenta anos atrás.
Mais cedo, Cida Moreira incendiou o teatro Luis Souo abarrotado com seu recital a Dama Indigna. Sozinha, ao piano, a mezo soprano, abriu com uma versão cababré de Simpathy for the devil, dos Stones e, lá pelas tantas, imprimiu uma densidade ainda mais complexa à Back to black, de Amy Winehouse. Cida é assim: quando canta, faz tudo o mais parecer secundário. Logo depois, às 19h, na frente do Mosteiro de São Bento, o grupo mineiro Galpão apresentou sua versão de Os gigantes da montanha, a fábula dramática de Pirandello sob a direção de Gabriel Vilella. Numa história cheia de referências à resistência do próprio teatro, fez o que faz quando o Galpão vai à rua: encantar.

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